Nos últimos anos, as bicicletas do tipo gravel se tornaram um verdadeiro fenômeno entre ciclistas que buscam versatilidade, aventura e liberdade para pedalar por onde quiser. Com a proposta de unir a eficiência da estrada com a capacidade de encarar terrenos acidentados, as gravel bikes conquistaram espaço entre ciclistas urbanos, aventureiros, competidores e entusiastas do bikepacking. Mas nem todos têm acesso imediato a uma bicicleta gravel dedicada — seja pelo custo, pela disponibilidade de modelos ou pela simples vontade de aproveitar o que já se tem em casa. Surge então uma pergunta comum e extremamente relevante: é possível transformar uma bike Speed ou uma MTB em uma gravel funcional?
A resposta, em resumo, é sim — mas com nuances. A possibilidade de conversão depende de uma série de fatores técnicos, estruturais e até mesmo do uso pretendido. Há ciclistas que transformam suas antigas bikes de estrada com pequenas adaptações: um pneu mais largo aqui, um guidão mais confortável ali, talvez um câmbio com maior amplitude. Por outro lado, há quem prefira usar uma mountain bike hardtail antiga como base para criar uma máquina capaz de encarar trilhas leves, estradões e até cicloturismo com bagagem.
Essa ideia de “transformar o que você já tem” tem ganhado força dentro da comunidade ciclística, seja por economia, seja por sustentabilidade, seja por pura criatividade. E ela não é apenas viável — em muitos casos, pode ser surpreendentemente eficiente. Com os componentes certos, ajustes bem pensados e conhecimento sobre as limitações de cada tipo de quadro e geometria, transformar uma Speed ou MTB em gravel pode render ótimos frutos.
Neste post completo, você vai entender tudo o que é necessário para adaptar sua bike atual ao universo gravel. Vamos explorar as diferenças entre os três estilos (Speed, MTB e Gravel), analisar quais peças devem ser trocadas ou ajustadas, explicar a importância da geometria, recomendar pneus compatíveis, sugerir upgrades inteligentes e mostrar casos reais de sucesso. Ao final, você poderá decidir com segurança se vale mais a pena converter sua bike atual ou investir em uma gravel bike dedicada.

1. Entendendo as diferenças: Speed, MTB e Gravel
Antes de sair trocando peças ou testando novos pneus, é fundamental compreender as diferenças essenciais entre as categorias de bicicletas envolvidas nessa conversa.
1.1 Speed (Estrada)
- Foco: desempenho, velocidade e eficiência em asfalto.
- Geometria: agressiva, com tubo superior mais longo e garfo curto para reduzir resistência ao vento.
- Limitação: espaço para pneus muito estreito; muitos quadros não aceitam pneus acima de 28 mm.
- Pontos fortes: leveza, rigidez e transferência de potência.
1.2 MTB (Mountain Bike)
- Foco: terrenos acidentados, trilhas técnicas e resistência.
- Geometria: mais relaxada, com suspensão frontal ou total.
- Componentes: pneus largos (geralmente acima de 2.0”), guidão reto, cockpit robusto.
- Limitação: menos eficiente no asfalto e terrenos duros.
1.3 Gravel
- Foco: polivalência em estradas de terra, cascalho, asfalto ruim e cicloturismo leve.
- Geometria: equilibrada entre conforto e desempenho, mais estável que a Speed, mais leve que a MTB.
- Pneus: largura média de 35 mm a 45 mm, com ou sem cravos.
- Extras: pontos de fixação para bagageiros, garrafinhas extras, bolsas etc.
2. Transformando uma Speed em Gravel: O que considerar?
Transformar uma bike de estrada em uma gravel exige atenção especial, principalmente porque muitas limitações estruturais não podem ser superadas apenas com upgrades.
2.1 Espaço para pneus
Este é o ponto mais crítico. A maioria das bikes de estrada foi projetada para pneus de 23 a 28 mm. Algumas mais modernas aceitam 30 mm ou até 32 mm, mas isso ainda pode ser insuficiente para encarar estradas de terra com conforto e segurança.
Dica:
- Meça o espaço entre os stays traseiros e o garfo dianteiro.
- Considere pneus slick de 30 mm com compostos mais macios (como Panaracer GravelKing 28c ou 32c).
- Use rodas com aro interno estreito (17–19 mm) para manter a estabilidade.
2.2 Geometria da bike
A geometria agressiva da Speed pode deixar o ciclista cansado rapidamente em terrenos irregulares. O centro de gravidade é mais alto e o ângulo da caixa de direção é mais fechado, dificultando a estabilidade em curvas com cascalho ou lama.
Soluções parciais:
- Trocar o avanço por um mais curto e/ou com ângulo positivo.
- Substituir o guidão drop por um modelo “flared” (aberto nas pontas), típico de gravel.
- Elevar o stack (altura do cockpit) com espaçadores extras.
2.3 Transmissão e relação de marchas
Bikes de estrada geralmente possuem relações voltadas para velocidade em asfalto (p. ex.: 52/36 ou 50/34 na frente com 11-28 atrás). Em subidas íngremes de terra ou com carga, essas relações podem ser impraticáveis.
Soluções:
- Trocar o cassete por um 11-32, 11-34 ou até 11-36.
- Instalar um câmbio traseiro de maior capacidade (ex: Shimano GRX, Deore ou Tiagra long cage).
- Alternar para coroa única (1x) com cassete 11-42 (se for compatível).
3. Transformando uma MTB em Gravel
Diferente das bikes de estrada, as mountain bikes — especialmente as hardtail antigas ou de entrada — são excelentes candidatas para conversão em gravel. Com pneus mais largos, quadro robusto e maior compatibilidade com diferentes componentes, elas oferecem uma base mais flexível para adaptação.
3.1 MTB hardtail: a base ideal para conversão
Se a sua MTB tem quadro rígido (sem suspensão traseira), suspensão dianteira ajustável ou até uma suspensão fixa, e utiliza rodas 29″, ela pode se tornar uma gravel bastante eficiente com alguns ajustes estratégicos.
3.2 Pneus mais estreitos e com menos cravos
O primeiro passo é trocar os pneus. As MTBs costumam vir com pneus de 2.1” ou mais, muito cravados, pesados e ineficientes no asfalto ou em terra compactada.
Dicas de pneus ideais para conversão:
- Largura entre 1.5″ e 1.9″ (aprox. 38 mm a 48 mm).
- Semi-slicks ou com cravos laterais discretos.
- Exemplos: WTB Byway 47c, Maxxis Re-Fuse 2.0″, Kenda Small Block Eight.
Observação: não tente forçar pneus muito estreitos em aros largos — isso compromete a segurança e o desempenho.
3.3 Troca do cockpit: do guidão reto ao drop bar
Essa é uma das mudanças mais polêmicas. Trocar o guidão reto da MTB por um drop bar (guidão de estrada) é possível, mas exige atenção à compatibilidade dos trocadores, manetes e câmbio.
Soluções possíveis:
- Usar um guidão flared com avanço mais curto.
- Manter o guidão reto e instalar bar-ends angulados para simular múltiplas posições de pegada.
- Instalar trocadores Shimano GRX ou SRAM Apex (caso migre para drop bar).
3.4 Suspensão dianteira: manter ou remover?
Suspensões consomem energia em pedaladas longas e aumentam o peso total da bike. Para gravel, uma suspensão dianteira não é essencial e pode ser removida ou travada.
Alternativas:
- Substituir a suspensão por um garfo rígido de alumínio ou carbono (há modelos específicos para conversão).
- Usar um bloqueio (lockout) sempre que estiver em estradas firmes.
3.5 Relação de marchas
Muitas MTBs já vêm com relação 1×11, 1×10 ou 2×9, o que é ideal para gravel. No entanto, a troca de cassete pode ajudar a melhorar a velocidade final ou reduzir o peso.
Sugestões:
- Usar cassetes 11-42 ou 11-46 com coroa única 38T ou 40T.
- Substituir componentes pesados por equivalentes de gravel (como câmbios SRAM Apex ou Shimano Deore leve).
4. Geometria: o que não dá para mudar (mas dá para adaptar)
Apesar de todo esforço, o que realmente diferencia uma gravel autêntica de uma bike adaptada é a geometria do quadro. Ela define como a bike se comporta em curvas, descidas rápidas, subidas em terreno solto e pedaladas longas.
4.1 O que muda em relação às outras bikes?
| Característica | Speed | MTB | Gravel |
|---|---|---|---|
| Ângulo da caixa de direção | Mais fechado (rápido) | Mais relaxado (estável) | Médio (estável + ágil) |
| Comprimento do chainstay | Curto | Longo (tração) | Intermediário |
| Altura do movimento central | Baixo (eficiente) | Alto (evita toques) | Médio |
| Reach (alcance) | Longo | Curto | Equilibrado |
4.2 Como compensar?
Você não pode alterar a geometria do quadro, mas pode ajustar o cockpit e o fit para se aproximar da posição gravel:
- Trocar o avanço por um modelo mais curto ou mais alto.
- Usar um canote com setback para mais conforto.
- Adicionar guidões flare ou ergonômicos.
- Regular a altura do selim para compensar a altura do movimento central.
5. Componentes importantes a observar na conversão
5.1 Rodas
- Verifique o tamanho: 700c (Speed/Gravel) ou 29″/27.5″ (MTB).
- Aros com largura interna de 21 a 25 mm são ideais para pneus gravel.
- Se possível, use rodas tubeless para menor peso e mais conforto.
5.2 Freios
- Freios a disco são ideais para gravel.
- MTBs já vêm com eles; algumas Speeds modernas também.
- Se sua Speed tem freios ferradura, atenção: o quadro deve aceitar pneus mais largos e pinças long-reach.
5.3 Transmissão e compatibilidade
- Verifique se o câmbio aceita o cassete pretendido.
- Evite usar componentes de estrada com MTB sem verificar a compatibilidade de puxada dos cabos.
6. Custos envolvidos na conversão
Converter uma bike pode ser mais barato que comprar uma gravel nova, mas nem sempre é tão econômico quanto parece. Vamos estimar:
| Item | Custo aproximado (R$) |
|---|---|
| Pneus gravel (par) | 350 – 700 |
| Guidão gravel (flare) | 250 – 500 |
| Avanço/canote ergonômico | 200 – 400 |
| Roda compatível tubeless | 800 – 1.800 |
| Cassete + corrente | 300 – 600 |
| Câmbio GRX ou similar | 400 – 1000 |
| Garfo rígido (opcional) | 500 – 1500 |
| Mão de obra (bike fit, ajustes) | 200 – 400 |
Total possível: R$ 2.000 a R$ 5.000 (dependendo do quanto você aproveita da bike atual)
7. Quando vale a pena converter — e quando não
Vantagens da conversão:
- Aproveita o que você já tem.
- Menor custo que uma bike nova (em muitos casos).
- Projeto personalizado.
- Satisfação de montar sua própria gravel.
Desvantagens:
- Pode haver limitações técnicas (geometria, compatibilidade).
- Nem sempre atinge o desempenho de uma gravel dedicada.
- Pode sair mais caro que modelos gravel de entrada usados.
- Revenda complicada.
Quando é melhor comprar uma gravel nova:
- Se você busca performance e conforto superior em longas distâncias.
- Quando o quadro da bike atual não permite pneus largos.
- Se o custo de upgrades ultrapassar 70% do valor de uma gravel nova.
8. Casos reais de sucesso
Exemplo 1: Speed antiga convertida
Bike original: Caloi Strada 2014
Alterações:
- Pneus 28 mm Panaracer GravelKing.
- Cassete 11-32 com câmbio Tiagra Long Cage.
- Guidão substituído por modelo flare.
- Avanço de 90 mm com ângulo +6°.
Resultado: Bike para estradas de chão batido e asfalto esburacado, ideal para longas distâncias.
Exemplo 2: MTB 29” convertida
Exemplo 2: MTB 29” convertida
Bike original: GT Avalanche 29”
Alterações:
- Pneus Schwalbe G-One Allround 2.0”.
- Suspensão removida, garfo rígido instalado.
- Transmissão 1×11 com cassete 11-42.
- Guidão reto mantido, com bar ends ergonômicos.
Resultado: Bike para trilhas leves, cicloturismo e estradas de terra com bom conforto.
transformar ou não transformar?
A decisão de transformar sua bike Speed ou MTB em uma gravel depende de uma análise honesta do seu uso, expectativas, orçamento e do que você já tem em mãos. A boa notícia é que sim, é possível, e muitos ciclistas têm feito isso com ótimos resultados — inclusive participando de eventos, viagens e longas jornadas com bikes adaptadas.
Se você é do tipo que gosta de colocar a mão na massa, explorar possibilidades e valorizar cada quilômetro pedalado com uma máquina que tem história, a conversão pode ser uma escolha apaixonante. Por outro lado, se busca desempenho puro, conforto premium e menor dor de cabeça com compatibilidades, talvez seja a hora de investir em uma gravel original.
De qualquer forma, com criatividade, conhecimento técnico e escolhas bem pensadas, transformar uma bike Speed ou MTB em uma gravel não só é possível — como pode ser uma das decisões mais divertidas do seu caminho no ciclismo.


Olá! Eu sou Otto Bianchi, um apaixonado por bicicletas e ciclista assíduo, sempre em busca de novas aventuras sobre duas rodas. Para mim, o ciclismo vai muito além de um esporte ou meio de transporte – é um estilo de vida. Gosto de explorar diferentes terrenos, testar novas bikes e acessórios, além de me aprofundar na mecânica e nas inovações do mundo do pedal. Aqui no site, compartilho minhas experiências, dicas e descobertas para ajudar você a aproveitar ao máximo cada pedalada. Seja bem-vindo e bora pedalar!






